Os estudiosos andam pecando pelo exagero em torno do aprendizado de uma cadela Border Collie Americana que compreende - ou identifica com objetos - mais de mil palavreas do nosso vocabulário.
Ao lado da Chaser, aparecem chimpanzés que do alto dos seus 98% de DNA igual ao humano, conseguem apreender um outro tanto de significantes. E, aqui no Brasil, o "Fantástico" mostrou há pouco tempo um cão paranaense que trazia corretamente as ferramentas pedidas para seu dono mecânico consertar os carros.
Como se isso fosse o melhor que eles, os bichos em geral e os cães em particular, pudessem apresentar ao mundo. Não sua intuição e seu faro apurados. A audição acima de qualquer suspeita. Ou a agilidade da qual nem o maior atleta se aproxima. Não o instinto perspicaz, capaz de detectar a chegada do dono - ou de um ladrão - com vários minutos de antecedência. Não a capacidade de não criticar e aceitar os maiores desatinos humanos como se fossem normais. Não a afetividade despida de segundas intenções. Nem mesmo a enorme capacidade de adaptação a circunstâncias às vezes bem desfavoráveis.
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Inventou-se há alguns anos uma tal de inteligência emocional, um conceito que traduziu uma certa evolução sobre a supremacia da inteligência racional. Os bichos, por seu lado, contam com uma inteligência amoroosa, digamos, que os guia por caminhos que quase nunca conseguimos entender. Ou imitar. E isso não tem nada a ver com eles saberem ou não o nome da bola azul, do osso vermelho ou da chave de fenda.
Vale uma inversão para tentar entender melhor. Imagine-se um cão, um Schnauzer, por exemplo, que decide ensinar ao dono, o qual ele muito ama, as diferenças entre os latidos. Para que entre os dois não ocorram mais mal-entendidos.
Passam-se anos, o cão já está de barbas brancas e é convidado a dar um depoimento na rádio Uivo, ou algo equivalente. E com a sinceridade que é peculiar à espécie, admite que fracassou. "Até hoje", diz ele, "quando faço o latido de querer sair para fazer xixi, meu dono pensa que estão batendo à porta. E quando digo que estou com fome, ele corre a buscar a coleira para passearmos. Eu, claro, não vou corrigí-lo. Então saio feliz a seu lado e atá esqueço que já se passou da hora do almoço e meu estômago está roncando".
Autora : Vivien Lando
Folha de São Paulo - sábado, 19 de fevereiro de 2011
Colaboradora : aumiguinha Nastácia
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